Como Eu Aprendi a Deixar de Me Preocupar e Passei a Amar a Bomba*

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Vamos deixar de lado os clichês estabelecidos há seis décadas e falar sério sobre a bomba atômica.

1) Se ela não existisse teriam morrido 1 milhão de americanos e 10 milhões de japoneses na programada invasão do Japão, na 2a. Guerra Mundial.  (Meu artigo: “Você jogaria a bomba atômica em Hiroshima ?”).  Em Hiroshima o número de mortos foi pouco superior ao do ataque à Dresden, que vitimou 135 mil alemães. (artigo: “Entrevista com o prisioneiro de guerra Kurt Vonnegut Jr.”) O episódio tornou-se um exemplo clássico da destruição em massa por bombardeio convencional.

2) Se os Estados Unidos não tivessem a bomba teria havido uma invasão da Europa pela União Soviética, após a Segunda Guerra Mundial.  Os exércitos de Stalin, em número gigantesco, inteiramente preparados, seriam irresistiveis para os pobres exércitos europeus, praticamente inexistentes. A Europa seria tomada. Os partidos comunistas de todos os países, em todos os continentes, se mobilizariam e provocariam guerras civis e guerrilhas. A primeira bomba atômica soviética foi testada somente em 1949, quatro anos depois de Hiroshima, portanto os europeus ficaram protegidos pela unilateralidade de posse pelos EUA até aquela data.

3) Conseguir a bomba não encorajou a União Soviética a atacar a Europa. A superioridade nuclear americana continuou sendo muito grande, principalmente pela capacidade que os bombardeiros americanos tinham de atingir com precisão as cidade russas. Durante muitos anos esses bombardeiros ficaram no ar dia e noite ( só pousavam quando os outros já haviam decolado),e dirigiam-se para a Rússia até receberem ordem de voltarem, o que pode ter sido o máximo da “loucura” a que se chegou nesses primeiros tempos nucleares. No entanto, o medo de um ataque convencional na Europa ainda persistia. Foram criadas a OTAN, Organização do Tratado do Atlântico Norte com forças americanas e européias, e o Pacto de Varsóvia, com a Rússia e satélites da Europa Oriental. Em número de divisões o pacto de Varsovia era muito superior, mas prevaleceu o medo de que se os Estados Unidos detonassem suas bombas seria a destruição total da Europa e Rússia, e posterior radiação atômica, igualmente temivel. O  que se convencionou chamar de Guerra Fria foi exatamente  o processo de transformações geo-políticas no mundo sem que houvesse uma luta direta direta entre os dois grande protagonistas, URSS e EUA, devido ao medo da hecatombe nuclear. Durante a maior parte desse período os soviéticos foram favorecidos ao incentivarem, em diversos países, as chamadas “guerras de libertação nacional” . Era a subversão através de dinheiro, armas, consultores soviéticos, e até mesmo pilotos russos. O medo da destruição total impedia uma reação mais forte americana. Por muito tempo os russos, de fato, estavam vencendo a Guerra Fria, comendo o mundo pelas bordas, implantando governos socialistas, ou simplesmente apoiando governos hostis aos Estados Unidos.

4 ) Um caso especial –  Em 1950 a União Soviética permitiu que a Coréia do Norte invadisse a Coréia do Sul. A agressão foi condenada pela ONU.  Os comunistas chegaram a tomar quase toda a península coreana. Com a intervenção de vários países -sob a bandeira da ONU,  e comando americano – o quadro inverteu-se, e as tropas norte-coreanas foram empurradas até sua fronteira com a China. Naquele momento os chineses entraram abertamente na guerra, enviando centenas de milhares de combatentes. Em consequência o comandante americano , general Mac Arthur, propôs que se jogassem bombas atômicas sobre a China ( que ainda não era nuclear). Foi tão insistente e deu tantas declarações para a imprensa que foi demitido pelo presidente Truman para mostrar que o poder civil se sobrepunha ao militar nos Estados Unidos.  As tropas chinesas obrigaram os americanos e sul-coreanos a recuarem. Pela primeira vez o mundo teve medo da China ao ver que seus dirigentes não se incomodavam absolutamente com as mortes em combate. Multidões de chineses passavam por cima dos cadáveres de seus companheiros e continuavam a avançar. Ao final, em 1953, concluiu-se um armistício determinando à volta ao paralelo 38, fronteiras originais entre as duas Coréias. Truman não usou a bomba atomica porque: 1) medo da retaliação russa, embora na época os Estados Unidos fossem muito mais fortes do que os soviéticos ; 2) a bomba, já considerada “imoral”, não se justificaria porque não estaria salvando vidas americanas em número significativo, tratava-se de uma guerra localizada e , como era esperado, voltou-se o status anterior ao da agressão norte-coreana.

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5) O que horrorizou em Hiroshima foi  a possibilidade de uma só bomba matar tantas pessoas. Apenas um avião, apenas uma bomba.  E na época havia o mito de algo desconhecido, com um perigo ainda não dimensionado. Cientistas davam entrevistas falando sobre uma suposta reação em cadeia na bomba de hidrogênio, não se conhecia bem a estrutura do átomo e a sensação era a de um salto no escuro. A bomba passou a ter um caráter demoníaco, um fruto da árvore proibida, terreno além da compreensão humana. Com a invenção dos foguetes intercontinentais (ICBM), passou-se ao risco de extinção da maior parte da humanidade em poucas horas de combate. A bomba tornou-se um símbolo da insanidade do homem, mas… não aconteceu. Em sessenta e cinco anos, somente foram detonadas as duas primeiras bombas fabricadas. (Os EUA blefaram, não dispunham de mais bombas contra o Japão) . O horror moral que acompanha a trajetória da bomba até nossos dias está ligado ao desaparecimento da vida na face da terra. Não se trata de crueldade. Quem pensa assim está desconhecendo as bombas incendiárias, o napalm e outras pequenas armas feito o lança-chamas. Nada se compara, por exemplo,  à Primeira Guerra Mundial, de uma barbárie tão grande que muitos autores atribuem à ela a descrença em Deus , que cresceu de maneira exponencial naqueles anos e nos imediatamente posteriores a eles. O gás, empregado pela primeira vez em 1914, foi a morte mais horrivel que se conheceu em todas as guerras. Era tão desesperador que nem Hitler, na derrota, teve coragem de emprega-lo, ( tendo sido ele mesmo uma das sua vítimas, quando ficou cego durante um período). A carnificina, as novas armas empregadas ( o avião), que liquidaram com a fina flor da mocidade na França, Inglaterra e Alemanha, ocasionaram um choque definitivo, a perda da esperança na racionalidade humana, o que veio a ser confirmado com o advento da 2a. Guerra, apenas 25 anos depois. Quando chegavam os telegramas diários ” sem novidades no front” isso queria dizer que estavam morrendo 5 mil pessoas por dia, o que era normal, nada para se ler ou comentar. De fato, “a morte de Deus” ocorreu na Primeira Guerra Mundial, e não no Holocausto, e muito menos em Hiroshima.

6) Na trajetória do mundo nuclear ocorreu um fato decisivo na década de oitenta.  O presidente Reagan decidiu vencer a União Soviética e anunciou um caríssimo plano que tencionava levar a bomba atômica para o espaço sideral. O plano, conhecido como ” Guerra nas Estrelas”, decretou o fim da União Soviética – todo mundo conhece a história. Foram libertadas centenas de milhões de pessoas na Europa e na Rússia. Sob todos os ângulos a bomba, até o momento, só nos trouxe benefícios. Brincamos com fogo, mas, ao contrário do que se previa, o desastre não aconteceu, muito pelo contrário. E a fase do perigo da hecatombe, devido a um erro, parece sepultada definitivamente. O surgimento da possibilidade do terrorismo com artefatos de bolso, atômicos e bacteriológicos é o novo e imenso problema.

Enfim, é apenas isso: superamos excepcionalmente bem um período crítico EUAxURSS, e entramos em outra enrascada que é a bomba em mãos fanáticas, ou irresponsaveis. Mas, para mim prevalece o fato: a bomba até agora salvou dezenas de milhões de vidas ao invés de ceifa-las. Se vai deixar de ser assim é outra história. Não vamos erigir um pedestal ao monstro, mas seria melhor deixar de repetir o que nos ensinaram, sem nos preocuparmos com a verdade. Então, quer gostemos, ou não, a bomba atômica, sem que tenha sido construída para isso, é a maior prova de que a energia nuclear veio para o benefício do homem.

* Título do filme de Stanley Kubrick : Dr. Strangelove or: (How I Learned to Stop Worryng and Love the Bomb)

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14 maio, 2010 às 05:27

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Categoria: Artigos

Comentários (6)

 

  1. Ótimo artigo!! Bem completo e informativo!!

    É o instinto de sobrevivência prevalecendo…mas que houve gente que se refestelou com aqueles japoneses cozinhando ah isso teve!!

    Coisa horrível!! Espero que tudo continue como está. Enquanto o homem não aprender a ser tolerantes com seus semelhantes e com a diversidade, ele vai precisar do medo como rédeas de sua selvageria!!

    http://ebraelshaddai.wordpress.com/2010/05/13/brasil-com-bomba-atomica/

    Abçs!

  2. Ronaldo Veloso Romão disse:

    Excelente artigo!

    Muitos dogmas foram derrubados de forma simples e objetiva, parabéns.

  3. Ronaldo Veloso Romão disse:

    A 1° foto é estupande! O cogumelo perfeito!

  4. Marcilio disse:

    Vc que escreveu essa materia quer dar uma de um cientista politico ao falar que Deus morreu, vc errou outra vez a primeira e a segunda guerra ñ vão passar nem perto da crueldade da terceira que vem, vc ñ sabi que os russos guardaram uma bomba chamada czar bomba ou mãe de todas as bombas tão devastadora q a explosão desta destruiria o seu propio territorio mesmo ativado em qualquer lugar da Europa, bombas atomicas ñ são clichês experimente ser consumido por uma !!!

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