Crimes contra o Estado

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Eu jogo fora, perco, rasgo, toda a memória do meu passado.Por muitos anos conservei uma folha psicografada do Chico Xavier,onde o“Dr. Bezerra de Menezes”, o espírito que se incorporava ao Chico, me dava conselhos.Também foi pro lixo. Uma pena, porque eu poderia escrever sobre a farsa encenada pelo maior medium do mundo na entrevista que tivemos. O melhor mesmo é não falar nada. Existem muitas histórias em minha vida que eu tenho mais é que ficar calado para não passar por mentiroso.

Ainda tenho documentos dos meus tempos de militância na esquerda. E vejam, o Márcio Moreira Alves, deputado federal, resolveu fazer uma palestra no auditório da universidade. Começou a nos explicar o que era a AP (Ação Popular), o que era o Partido Comunista, o que era a Polop (Política Operária). Na platéia ficamos encantados com o espetáculo da sua ingenuidade.Eu,coordenador regional da AP, ao meu lado o Evandro Mauro, o cabeça do Partidão. Mas como é que esse sujeito, que não sabe de nada, entra aqui e vai nos mostrando, de maneira professoral, o que ele pensa que são os diversos grupos que se reunem da maneira mais reservada possivel, e que tentam manter em segredo sua organização. Mal podíamos acreditar. Hilariante. Um quinto do auditório deveria ser de militantes. Marcito falava e pontificava, com a confiança redobrada, interpretando mal a platéia, que se divertia, e sorria como se aprovasse suas bobagens. Poucas vezes devo ter visto tamanha falta de sensibilidade. De uma hora para a outra aparece na universidade de Brasília um deputado almofadinha nos ensinando o que era subversão! Márcio foi um daqueles caras que se descobriram de esquerda APÓS o golpe e ficou todo entusiasmado com a novidade. Não me lembro se para sacanear fizemos alguma pergunta. Algumas semanas depois ( ou terão sido meses?) o eufórico personagem, famoso da noite para o dia,pronuncia um violento discurso no plenário da Câmara e pede para que as moças não mais dançassem com os cadetes das escolas militares. Uma represália pelo golpe de estado! Não posso imaginar melhor exemplo para mostrar nosso estado de confusão mental na época. Achar que a classe média estava contra o golpe militar! Achar que as moças não dançariam com os oficiais porque eles eram maus! E nós éramos os bonzinhos! Logo nós, que não tínhamos o apoio nem dos nossos pais! Ah,foi divertidíssimo.Os militares acharam ótimo o discurso. Editaram o AI-5. Tenho saudades daqueles tempos.Youth!

Bem, alguns papeis não desapareceram porque devo ter ficado intimidado com o tamanho do calhamaço que é o meu processo de reintegração no cargo que perdi, quando dei o fora de Brasília. É o que me permite (presumo),ser politicamente de direita com alguma autoridade.Claro que não preciso de um documento na gaveta para me comparar com os festivos, que nunca fizeram nada,e têm a arrogância de ficar botando banca prá cima de mim. Outro dia eu falava contra o comunismo quando me interromperam.Um desses esquerdistas de salgadinhos e canapés gritou que a caça ás bruxas já havia terminado. Senti um ódio assassino porque eu era uma daquelas bruxas. Um passo a frente e estaria na guerrilha. Não fui porque tinha certeza absoluta que ela fracassaria, mas houve o convite, feito pelo Flavio Tavares,e hoje me sinto honrado por ter sido escolhido entre tantos outros. Ficamos longo tempo conversando de pé, em um lugar que não existe mais.Flavio esteve no grupo que foi trocado pelo embaixador Elbrick, no golpe sensacional armado pelo Gabeira.

O Exército me enviou o seguinte documento:

INTIMAÇAO – Líster de Figueiredo, Major de Infantaria, encarregado de um Inquérito Policial-Militar, a fim de apurar os crimes militares, os crimes contra o Estado e a Ordem Política e Social determina a Claudio Mafra, residente á Universidade de Brasília, que compareça sob as penas da Lei, no dia 28 de setembro de 1965 ás 13 horas, no quartel do Batalhão da Guarda Presidencial a fim de prestar declarações no caso em que é INDICIADO.”

Gosto muito desse elegante “crimes contra o Estado”. Eu realmente pratiquei todos os crimes que me atribuiram

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11 maio, 2009 às 06:26

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Categoria: Artigos

Comentários (4)

 

  1. Rodrigo disse:

    Grande Mafra,

    Sou de Minas Gerias, da cidade do Chico Xavier. Por favor, conte o caso da fraude dele. Eu posso contar alguns casos da juventude dele que meu avó sempre conta.
    Nas palavras dele: “Ele era meio delicado, tinha umas brincadeiras estranhas”.
    Sobre a carta que ele psicografou para a minha mãe, onde minha avó (viva até hoje, aos seus 94 anos) lhe contava sobre a outra vida.

    Obviamente o seu caso deve ser muito mais interessante.

    Abraços,

    • claudiomafra disse:

      Caro Rodrigo, eu já deveria ter contado a história. Prometi faz tempo e vou me esquecendo. Preguiça, ou bloqueio, quem pode saber ? abraço, obrigado pelo comentário e pela informação adicional.

  2. evandro mauro disse:

    Querido Cláudio, antes de mais nada quero agradecer-lhe a citação do meu nome no artigo acima bem como a lembrança de minha participação naquela época, na UnB. Estou te acompanhando através do “Reflexões Radicais” e feliz com este reencontro. Um grande abraço,
    Evandro.

    • claudiomafra disse:

      Evandro!!! Mal posso acreditar! Queridíssimo amigo, esta vou realmente uma enorme surpresa. Vou entrar em contato por e-mail. Nem sei o que dizer agora. Um grande abraço, também.

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