1) Pronunciamentos de militares a respeito da crise 2) Os procuradores da República e a violação de direitos humanos durante o regime militar
General que escreveu manifesto não teme ser punido por Amorim ( O GLOBO)
SÃO PAULO – Autor do manifesto que inflamou a relação entre militares, Ministério da Defesa e a presidente Dilma Rousseff, o general Marco Antonio Felicio diz não temer ser punido pelo que escreveu, por entender que não haveria base legal para tal. Ele evoca lei aprovada pelo ex-presidente José Sarney que garantiria aos militares da reserva o direito de se expressar sem que fossem punidos. Ex-analista do Centro de Informações do Exército (CIE), Felicio receia que agentes do Estado sejam execrados pela Comissão da Verdade e ainda duvida ter havido tortura ou execução de presos políticos, apesar de admitir ter havido excessos “em ambos os lados combatentes” na guerra contra atos da “subversão marxista-leninista”. Ele aceitou dar entrevista ao GLOBO desde que ela fosse por e-mail. Perguntou ao repórter se ele era patriota. Ao ser questionado se respeitava a autoridade do ministro da Defesa Celso Amorim e da presidente Dilma, respondeu: “Tanto quanto eles respeitam a minha”.
O GLOBO: A presidente Dilma Rousseff ameaçou prender pelo menos um militar da reserva como reação ao manifesto com críticas ao ministro Celso Amorim e à Comissão da Verdade. Como autor do documento redigido, o senhor temeu que fosse o senhor?
GENERAL MARCO FELICIO: Não temi e não temo, pois usei do direito que a lei me faculta: a liberdade de expressão com responsabilidade. A verdade e somente a verdade.
O senhor já foi informado oficialmente sobre alguma punição ao senhor ou a colega militar em função do manifesto?
FELICIO: Não, pois creio firmemente que não haja base legal para tal.
O manifesto menciona o ministro Celso Amorim como alguém sem autoridade ou legitimidade para pedir a retirada de outra nota do site do Clube Militar, com críticas a Dilma e duas ministras. O que o senhor quis dizer com isso?
FELICIO: Reafirmo o que escrevi. O Clube Militar é uma associação de caráter civil e pela lei em vigor não é passível de qualquer tipo de ingerência por parte do Ministro da Defesa. Isto significa não ter ele autoridade ou legitimidade para tal. Qualquer um que leu o documento compreenderá o sentido do que lá está escrito.
No texto, há a seguinte frase: “O manifesto supracitado reconhece na aprovação da “Comissão da Verdade” ato inconsequente de revanchismo explícito e de afronta à lei da Anistia com o beneplácito, inaceitável, do atual governo”. A Comissão da Verdade não tem poder de punir judicialmente qualquer militar. Por qual motivo, então, os senhores a consideram uma afronta à Lei da Anistia?
FELICIO: Não é esta a motivação expressa quase que diariamente por pessoas do governo e a ele ligadas. Querem a partir da Comissão da Verdade encontrar caminhos para a punição dos agentes de Estado. E o que fazer com os agentes da subversão marxista que mataram, roubaram, assaltaram, sequestraram e justiçaram os próprios companheiros além de lutarem pela implantação de uma ditadura comunista no Brasil? Porque execrar somente os agentes de Estado que exerciam ações legais?
Hoje o governo federal reconhece casos em que presos políticos foram submetidos a tortura por agentes de Estado. Alguns deles estão até hoje desaparecidos e provavelmente foram mortos. O senhor considera estes episódios específicos como “ações legais”?
FELICIO: Quem comprova tais denúncias? Mário Lago já orientava, em seu tempo, que todos os presos saíssem da prisão afirmando que tinham sido torturados barbaramente, mesmo que tivessem sido bem tratados. De quando em quando aparece um “desaparecido”. Logicamente que uma guerra não se faz com flores e em ambos os lados combatentes há sempre excessos. Por qual razão, aqui, apurar-se tais ditos excessos somente cometidos por um lado? Não tenho conhecimento de torturas. Tenho conhecimento de operações de combate, cumprindo-se ordens superiores e dentro da lei então vigente.
O senhor pede que sejam apurados excessos cometidos por combatentes. Mas não foi justamente isso que ocorreu durante o governo militar, quando militantes de esquerda foram presos e condenados à prisão?
FELICIO: E quantos outros não o foram? Qual a razão de não serem apurados os fatos correlacionados com estes?
Os excessos cometidos por agentes de Estado tiveram como consequência o desaparecimento e provável morte de presos políticos. Não seria razoável que hoje representantes das Forças Armadas ajudassem o governo federal a encontrar esses corpos? Mesmo nas guerras, não é direito de um povo enterrar seus mortos?
FELICIO: Sem dúvida, todos querem enterrar seus mortos. Muitos anos se passaram, o que torna a tarefa muito difícil. Já foram realizadas buscas orientadas pelo Ministério da Defesa, inclusive com o auxilio de militares, e nada foi encontrado.
Para o ministro Celso Amorim, os signatários do documento não respeitam a “autoridade civil”. O senhor concorda com o que disse o ministro?
FELICIO: Gostaria de saber de que argumentos concretos o ministro se vale para tal afirmação. Ele deve saber que o autor, e não autores dos documentos, é profissional com mais de 45 anos de bons serviços prestados à nação, tendo frequentado todos os cursos do exército e alguns civis, conforme atesta a sua folha de alterações onde estão os depoimentos de seus ex-comandantes e as ações que desempenhou no combate aos atos violentos da subversão marxista-leninista.
O senhor poderia detalhar exatamente que ações desempenhou? Por quais órgãos o senhor passou, qual era a sua função neles e quais são os feitos que, ainda hoje, são motivo de orgulho para o senhor?
FELICIO: Fui oficial de informações de unidade e trabalhei como analista do Centro de Informações do Exército (CIE). Orgulho-me de ter contribuído com o meu trabalho, que julgo dedicado e eficiente, na erradicação da subversão marxista-leninista e das violentas ações da guerrilha urbana e rural, causadoras de ações terroristas e das mortes de tantos inocentes, evitando que o povo brasileiro fosse privado de sua liberdade.
Como militar da reserva, o senhor respeita a autoridade do ministro da defesa Celso Amorim e da presidente Dilma Rousseff?
FELICIO: Tanto quanto eles respeitam a minha. Na vida militar o respeito é recíproco.
Não há militares da ativa entre os signatários do documento. Eles temem sofrer algum tipo de punição caso assinem o documento?
FELICIO: Não, eles cumprem apenas a lei, como é da formação dos mesmos. Os militares da reserva e reformados tem livre manifestação de suas opiniões, incluso as de caráter político. Isso não ocorre com os oficiais da ativa.
O senhor acredita que, se pudessem, os militares da ativa assinariam o documento?
FELICIO: Creio que sim, pois, o exército de hoje, quanto aos seus valores, não é diferente do exército de ontem.
Quais são os valores do exército de ontem que permanecem no exército de hoje?
FELÍCIO: As manifestações essenciais dos valores militares são: patriotismo, civismo, fé na missão do exército, amor à profissão, espírito de corpo e o aprimoramento técnico-profissional. Por tal razão estamos coesos e unidos para acorrermos a qualquer chamamento da nação. E isto está presente na história pátria em todos os momentos de gravidade e de inflexão da mesma. Não será diferente no presente e no futuro.
O que o governo deveria ter feito para evitar este desentendimento com os militares da reserva?
FELÍCIO: Não governar pelo retrovisor, respeitar a dignidade dos militares e dar o devido valor às suas Forças Armadas.
Na nossa conversa pelo telefone, o senhor me perguntou se eu era um jornalista patriota. Para o senhor, o que é ser patriota?
FELÍCIO: Há coisas na vida que foram feitas mais para serem mais sentidas do que explicadas ou entendidas. Assim também é ser patriota. É um sentimento de amor e orgulho pela nossa pátria. É servir e defender o nosso povo, o nosso território, mesmo que se tivermos de dar a nossa vida para isso.
MARCO BALBI-Clube Militar
Minha cara jornalista! Ouvi o seu comentário hoje pela manhã na CBN e me cabe fazer alguns reparos!
Em primeiro lugar a senhora “fundiu” dois documentos num só.
No dia 16 de fevereiro o Clube Militar publicou no seu site e difundiu aos sócios e ao público em geral, um manifesto no qual solicitava à presidente da república que cumprisse a promessa feita em discurso quando da festa da vitória no qual dizia que governaria para todos os brasileiros. Relembrava o manifesto que, duas de suas auxiliares, uma delas costumeira em manifestações deste tipo, assim como as resoluções do partido ao qual pertence, contrariavam explicitamente a promessa.
O manifesto passava até certo ponto ignorado pelo público e pela mídia, até porque era carnaval, quando uma colega sua fez uma ilação de que o manifesto representaria, também, a opinião dos militares da ativa, afinal o clube os têm como sócios, mas impedidos de se manifestar por conta das normas vigentes. Imediatamente outros profissionais da imprensa repercutiram o assunto, alguns deles até minimizando a história.
Eis que, numa reação despropositada e ilegal, o Clube Militar recebe a solicitação de retirar o Manifesto da sua página e atende o pedido, por julgar naquela oportunidade, dia 23 de fevereiro, que o objetivo de chamar a atenção para atitudes pouco republicanas de auxiliares da presidente, sem a devida admoestação, já havia sido atingido.
Pois bem, um grupo de brasileiros, militares e civis, sócios e não sócios do Clube Militar resolveu redigir um texto, com o título Alerta à Nação, em desagravo ao Clube Militar e o postou no site A Verdade Sufocada. Mais uma vez uma reação despropositada ameaça os militares signatários deste alerta de processo e/ou punição à luz dos regulamentos, ameaça esta perfeitamente arbitrária e ilegal, por não ter respaldo algum na legislação em vigor. Ou seja, o governo escalou a crise, pois a partir daí o alerta passou a receber adesões até mesmo inesperadas.
A senhora diz que a presidente é indecisa, mas não está sendo absolutamente fiel. Ela não decide nada, ela não manda nada, até porque não tem perfil para isto. Ela é, tem, uma imagem forjada, fabricada que não condiz com a realidade dos fatos
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Mas, a senhora cometeu uma grande injustiça para com o Clube Militar. Coerente com as suas tradições o clube, além da parte recreativa, esportiva e cultural, permanece atuante na discussão os grandes temas nacionais. Infelizmente não interessa a mídia dar divulgação aos eventos que são ali realizados e para os quais a senhora mesmo foi convidada e nunca deu uma nota sequer sobre os mesmos. Assim foram realizados painéis sobre a Amazônia, sobre a Liberdade de Expressão, sobre o PNDH 3, sobre revisionismo histórico, enfim, por ano são realizados pelo menos 4 painéis de assuntos relevantes.
Espero que os próximos a senhora ajude a divulgar e até mesmo dê a honra do seu comparecimento. Caso a senhora não tenha nada muito importante na sua agitada agenda esteja convidada para o painel 1964 – A Verdade, a se realizar dia 29 de março, das 15 às 17 horas no Salão Nobre do 5º andar da sede central, Av Rio Branco, 251, com a participação do Dr Heitor de Paola, do jornalista Aristóteles Drummond e do Gen Luiz Eduardo Rocha Paiva, sob a mediação do seu colega Joelmir Betting. Espero vê-la por lá
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Grato pela sua atenção e pode ter a certeza que o jogo de biriba, apesar de importante, não é a atividade primordial dos sócios do clube. Leia a página do clube e acesse os links da Revista. Leia as matérias ali postadas sobre a remuneração dos militares e a série de matérias sobre a Comissão da Verdade, todos ali colocados desde o ano passado, onde a senhora poderá constatar que a preocupação dos sócios vai um pouco além do conceito que a senhora parece fazer deles. Eles pensam o Brasil, como o fizeram seus antepassados, lá se vão mais de 120 anos.
Novamente, grato pela atenção. Marco Antonio Esteves Balbi – sócio do Clube Militar
OS PROCURADORES DA REPÚBLICA E OS CRIMES DO REGIME MILITAR
Os procuradores da República designados para investigar os crimes do regime militar (1964-1985) discutem estratégias para evitar que o trabalho seja suspenso por medidas judiciais. Uma delas é a abertura de procedimentos investigatórios criminais, em vez de inquéritos, para apurar os casos. Como o procedimento é uma etapa inicial, conduzida internamente pelo Ministério Público Federal (MPF), sem a participação da autoridade policial, os procuradores entendem que a investigação fica menos exposta a um eventual pedido de trancamento feito por advogados dos investigados com base na Lei da Anistia.
O MPF criou um grupo de trabalho denominado Justiça de Transição, que mobiliza procuradores da República do Rio, São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, e Pará, para os casos de violação de direitos humanos durante o regime. Embora os militares tenham ficado 21 anos no poder, o trabalho será concentrado nos “anos de chumbo”, entre 1969 e 1976, quando ocorreu a maior parte dos casos de tortura, morte e desaparecimento de presos políticos. A primeira reunião conjunta será no início da próxima semana, em Brasília, quando os procuradores selecionarão os casos prioritários e definirão as estratégias. Outra hipótese estudada, caso a Justiça entenda que os torturadores do passado ainda são passíveis de punição, é oferecer a delação premiada a quem estiver disposto a colaborar, como é feito para crimes comuns.
A formação do Justiça e Trabalho foi uma indicação da 2 Câmara de Coordenação e Revisão do MPF. A atuação do grupo atende à sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que condenou o Brasil, por violações de direitos humanos em casos ocorridos na Guerrilha do Araguaia, a investigar o desaparecimento das vítimas. A preocupação dos procuradores é que o trancamento de um único caso jogue por terra todo o trabalho. O procedimento investigatório que será usado é reconhecido pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal como “instrumento de coleta de dados destinado a apurar a ocorrência de infrações penais de natureza pública, servindo como preparação e embasamento para o juízo de propositura, ou não, de ação penal”.
Outra possibilidade, mais remota, é a instauração de inquérito civil público, geralmente destinado a apurar os casos de improbidade administrativa. Mas isso significa optar por uma abordagem cível, e não criminal.No Rio, o MP já abriu procedimento para investigar o desaparecimento, em 1971, de Carlos Alberto Soares de Freitas, o Beto, na época um dos comandantes da organização armada VAR-Palmares (a mesma que abrigou a hoje presidente Dilma Rousseff). – Não será um trabalho isolado, vamos atuar em conjunto com outros estados. É uma área muito delicada. Vamos resgatar a memória dos casos num trabalho quase que arqueológico. Muitas provas foram destruídas, muitas pessoas já morreram – diz o procurador da República Luiz Fernando Lessa. Lessa divide o comando do Justiça e Trabalho com os procuradores Fábio Seghese, Antonio do Passo Cabral e Ana Cláudia Alencar. Segundo o grupo, o MPF poderá investigar agentes públicos mesmo que o Ministério Público Militar tenha arquivado ou venha, eventualmente, a arquivar investigações. ( O Globo)